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Ali fora as águas chegam pra amenizar o calor, limpar e renovar, mesmo que o ralo transborde ou alague a sala limpa. A gente aproveita pra regar livre a planta bonita que veio enfeitar a casa, mesmo que isso exija forçar mais e se estirar até a ponta dos pés. O tempo das plantas tem chegado como tempo de cuidar de dentro. Lá fora as geografias impossíveis, embora ainda se escute canto de passarim. Aqui os alentos da terra úmida de sentir o cheiro e enterrar as mãos, das cores vivas e das alegrias tranquilas. O olhar/retrato é de @fa.bio.santos. Muito agradecida, meu bem. 🍀🌻

 

Laurita

Fev/2020

Tajá

Tempos atrás decidi pedir de presente azamizade mudas de suas plantas preferidas pra enfeitar meu pedacim de terra lá no Pinga, na serra do Horebe, a casa e o terreiro que eram de vozinha Licôr. Chamaria cada planta pelo nome de quem me presenteou e perto delas teria uma plaquinha de madeira com seu nome de planta, seu nome de pessoa e a data que chegou por lá. Fiquei pensando que era um bom jeito de ter nossa energia materializada naquele chão que tanto amo, quando não estivermos mais nesse plano, pra povoar o assunto de quem for chegando depois. Ter plantas em casa hoje me faz sentir um pouco no Pinga, no Horebe, no sertão. Cuidar das plantas também é um movimento de cuidado mais pra dentro que pra fora, cuidado comigo, com as cores que escolhi para a vida e com as pessoas que sempre deixam um tanto delas aqui em mim e na minha casa. É deixar desconectar e ir embora o que não cabe mais por aqui. Essa bonita no retrato se chama Valéria, pois veio do quintal de Maria Valéria Rezende, e vive aqui se misturando com sua literatura/memória de dizer de pessoas e realidades invisibilizadas. Com poesia, sempre:

“Eu ficava tão magoado vendo uma árvore morrer que me abraçava com ela querendo morrer também. Depois juntava as sementes que ela espalhava no chão para lhe dar uma descendência longe daquele perigo. Foi aí que os companheiros me apelidaram de Caroço. Os bolsos das minhas calças viviam encaroçados dessas promessas de vida que eu guardava sem saber se ia poder semear ou se iam morrer comigo”.

É um trecho do livro Ouro Dentro da Cabeça. ❤️

 

Laurita

jan/2020

purificação

“Nas quedas as águas criam forças para seguir sua jornada”. – era Pernambuco quase Bahia quando li isso anos atrás. E é do que lembro cada vez que olho pra esse retrato de minha chegança na Cachoeira da Purificação, no dois de janeiro. A potência que veio junto das águas geladas que não trouxeram medo. Mergulho com gosto, entrega e rito depois de uma trilha metáfora da vida em cada passada. Conexão e entendimento. Há que se agradecer o coração sossegado.

Laurita

Derramou

São Sebastião derramou

Amor na água que te deram pra tomar.

Bebe, bebe

A água que te deram pra tomar.

 

– Por Alessandra Leão

U-ni-du-ni-tê

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Querendo, dá pra escolher a tristeza do dia, todo dia. Do mais íntimo ao coletivo. Que tempos… :/
Mas hoje tô escolhendo botar uma escrita em dia, cuidar do jardim, um café quentinho pra aquecer nesse ar de chuva, ler no balanço da rede e curtir minha casinha com essas cores que escolhi pintar na Vida.
Deve ser porque é feriado, que chega abrindo brecha na rotina. E é estranho pensar que isso simples que semeia paz e sorrisos só cabe nos parênteses dessa Vida vexada, tempo engolindo a gente. Do lado de dentro do muro, um grito escrito em vermelho de “pressa de viver”. Eita Belchior danado…
Mas aqui na vitrola Elis tá cantando O Cavaleiro e os Moinhos, de João Bosco e Aldir Blanc, já mudei uns pregos nas paredes, tô olhando pra cartinha e pras flores lindas que Dani, mi hermana de morada, deixou de carinho antes de viajar, e tb tô fazendo um plano pra que isso leve que merece ser vivido, também possa caber nos dias de lutas, de carmas, de escolhas, de resistências… 🍃

Laurita

80 anos de Tom Zé

Oitenta é um número graúdo para contar os anos. E é um grande privilégio estar no mundo no mesmo tempo que Tom Zé. Desejo muita fartura de Vida para esse Baiano de Irará que consegue ser vanguarda em qualquer tempo. Deixo aqui alguns registros de quando ele veio em João Pessoa, em agosto último, e topou uma prosa massa com um povo que desalinha do estabelecido. Foi mais um passo pro meu projeto de doutorado. Uma grande lisonja tê-lo numa roda de conversa sobre o conhecimento narrativo que se perpetua pela cultura oral, em contraponto ao cientificismo, ao saber cartesiano e às padronizações que tanto excluem. Vida farta a esse querido, genial e generoso Tom Zé!

Hoje. 12 de setembro de 2016. Mais um daqueles sinais do Universo que me chegam no momento exato, pra fazer entender que há conexão e proteção. Que palavra silenciada encontra jeito de dizer. E diz. Pelos oceanos virtuais me deparo com esse texto que diz de deslugares para corações selvagens. Respiro e agradeço. Tem dia que dura um ano. E que venham os novos amanheceres…

Belchior; Cantor

Musico Belchior em 1977. FOTO DIVULGAÇÃO.

– E aquele poeta, moreno e latino, que, em versos de sangue, a vida e o amor escreveu… Onde é que ele anda?

– Ninguém sabe dele…
– Fez uma viagem ?
– Não, desapareceu.

Belchior parece conhecer a fúria da vida como pessoa sensível que é ao reconhecer que os aspectos da vida da forma que é (im)posta ainda não possui oxigênio, espaço e afabilidade o bastante para adequar-se a sua rebeldia. Poucas pessoas conseguem enxergar, compreender e deixar escorrer pelos poros e pelas tintas das canetas as modulações implacáveis da vida. É preciso saber sentir, saber chorar, é preciso ser atingido por dores que parecem insuportáveis, buscar a poesia inalcançável da realidade viva e não encontrá-la nunca. É preciso ter a consciência lúcida de que a vida ignora a fragilidade dos corações , e consequentemente os atropela de diferentes formas – todas frívolas -.Meu bem, talvez você possa compreender a minha solidão O meu som, e a minha fúria e essa pressa de viver. Não adianta apelar para Deus ou pedir a vida para que pise devagar. Pouco importa se o coração é como vidro ou feito beijo de novela, e o ”pouco importa” é o que direciona os descontentamentos dessa sensibilidade que se confronta o tempo inteiro com um mundo colérico e apático. Viver é ser atropelado diversas vezes, Belchior.

O que fazer quando não se cabe na própria vida, no próprio corpo, na própria alma ou na própria canção? Onde estão as repostas, as vias, as saídas quando não há evasões razoáveis que respeitem os desejos e as velocidades? Talvez na ausência. Não quero o que a cabeça pensa eu quero o que a alma deseja. Arco-íris, anjo rebelde, eu quero o corpo tenho pressa de viver. Belchior deseja o desejo de forma pura, nua. É subversivo ao afirmar não querer o que a cabeça pensa e que anda pelo caminho errado pela simples alegria de ser. Como viver no mundo sem a racionalidade de se guiar pelo que a cabeça pensa? Não é viável, Belchior. Não sem uma angústia violenta. Mas Belchior quer o que a alma deseja ainda que não encontre a alma nas coisas.

Não há a profusão de sensações tencionadas no cotidiano, e essa é uma condição de desolação em que Belchior vê o amor esvaziando-se e canta a diminuição do sentimento que mais importa: o amor. E no escritório em que eu trabalho e fico rico, quanto mais eu multiplico Diminui o meu amor. Como é avistar o que mais importa em uma vida ruindo-se e indo embora pela veemência morta do cotidiano? Talvez fugindo dele e aceitar a perversa – e imutável – juventude do coração que compreende apenas um universo restrito e vulnerável em demasia. Escreva a frase que só entende o que é cruel e o que é paixão em uma folha de papel e reflita sobre a aflição de possuir um coração que só capta essas emoções tão divinas e tão quebradiças. Não é fácil conceber o infinito de Belchior.

Belchior cansado do peso da cabeça, tem medo da hora da verdade que ele sabe – dentro de si e da canção – que vai chegar, fazendo-o andar de mãos dadas com a solidão, que talvez seja a sua grande – e paradoxal busca – depois do amor. Belchior não estava cabendo no mapa do Brasil. Ele tem medo de Minas Gerais, de Vitória, de Goiás, de São Paulo, da Bahia e de todos os estados do país. Todos esses lugares parecem não sustentar um coração selvagem onde há dor e silêncio. Belchior quer o novo momento, quer jogar tudo fora e fugir. Quer pegar um avião ou um navio para um lugar onde um jovem como ele pode amar e ser feliz. E adivinha? Ele procurou passagem e não havia linha praquele país.

Belchior parece ser feito de buscas intermináveis. Faz da existência um lugar grandioso demais para deixar-se um deserto árido. Ainda não há superfície que abrigue o deslugar, a pulsação e a intensidade de um homem como Belchior. Perder-se no mundo foi o único jeito de se encontrar. Ainda que ele continue perdido.

O texto é de  Juliana Magalhães e também está aqui:
https://pilhasepilherias.wordpress.com/2016/09/12/belchior-um-coracao-selvagem-no-meio-de-uma-geografia-impossivel/

luz do meu terreiro

chão do meu terreiro

Essa foto é muito simbólica. O pôr do sol é sempre de uma boniteza e melancolia imensas. Representa muito dos ciclos naturalmente se encerrando para dar lugar a transição para outro dia, outro tempo. Sempre achei que é depois dele, antes da noite chegar com suas durezas, mistérios, fugas, seduções e curas, a hora que o mundo fica com a cor mais bonita. Um ano atrás eu fiz essa foto lá no meu chão, na minha casa no Pinga que foi da minha Vó Licôr. Ainda não tinha consciência de que era tempo de ciclos se encerrarem. Até hoje corro pelos terreiros dos dias do jeitinho que Larissa e Maria Luiza correram para essa luz melancólica que aquece tanto a alma, tal qual o nascer do sol do outro dia que sempre vem. As curas, nas noites, chegam a preço de muito autoconhecimento. Preço caríssimo esse de trazer a própria pequenez à luz, olhar com honestidade para o que há de mais involuído em si e se querer pessoa melhor. Mas vi também que dessa sombra penumbrosa a gente consegue enxergar as cores todas do caminho com clareza assustadora. E é bonito demais. É chegar naqueles lugares sensíveis e perenes que nos fazem sentir as proteções, a mágica dos Encontros, o Sagrado Feminino, as razões de ser para o que há pouco não se compreendia. Às vezes um dia dura um ano. E assim vou findando transições, acertando o passo entre um flerte com a noite e a mansidão do dia que chega pela minha varanda. Aqui na rede rubra e num balanço vagaroso, vou bebendo dos sóis nesses dias que chegam no litoral e aquecem a alma tal qual o suor de Larissa e Maria Luiza, de encontro ao ocaso no terreiro meu e de vozinha lá no Pinga, na minha Serra do Horebe.

É um bom dia de gratidão! 💙

Laurita.

Transmutar

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Linda. Graúda! Ela pousou aqui do lado da escada, já faz bem muito tempo, e tá serena, como que espiando o movimento da faxina na casa, nesses tempos que em mim energias também se melhoram, se encontram, se inteiram. Penso no tempo em que naturalmente nos desvencilhamos das teias que envolvem os sentidos caros, teias que se não os sustentam, apenas prendem. Borboletas, dizem, são sinais de renovação e transformação. É tempo de ir, mas principalmente de chegar. Inaugurar lugares interiores. Aquele sonhar e escrever em letras grandes. De novo. Feliz, no sossego de quem escolhe viver sem reserva pro mundo. E se esgota. E quando revive, é com limites alargados. Espírito se forjando melhor, mas com cuidado ao outro, regra primeira. A borboleta pousou na parede da lembrança, esblumada de elegância e liberdade.

Jaguaribe Carne

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Algumas palavras, sentimentos e sensações me vieram ao juízo vendo o Jaguaribe Carne ontem. A primeira sensação foi de Privilégio. No palco um se desafiar, desconfigurar. Atemporalidade. Linhagem. Inquietação. Desapego. Resistência. Encontro. Generosidade. Ser fora da curva, não ter forma. Esse flerte com a incerteza certamente nos acessa aqueles perenes lugares criativos: as odisséias interiores. Porque sem segurança, sem cálculo, cru. Fuerza Bruta. Razão universalizante alguma. Avesso do presumido. O flertar os velhos abismos.

Quis filmar, guardar. Ensaiei. E achei incoerente manter preso a uma “forma” que eu pudesse vê-la repetida. Negaria sua própria natureza. Desisti. Já estava gravada em mim. Passar adiante, partilhar, apenas longe do cartesiano medido. Que coubesse às velhas tradições orais perpetuarem nas boas rodas de conversa de botequim. E foi esse meu quinhão àquele indizível.

Veja, aquilo era desalinho. E tenho fascínio pela palavra-forma Desalinho. Vivo fazendo exercícios para não enxergá-la. E ela me chegou inteiramente amparada, anunciada, significada, justificada naquela sonoridade, nos gestos, sentidos muitos. Mas poucas vezes vi reflexos d’alma extraindo o extremo desses sentidos. Cegando, quase. Por um triz, tudo.

Laurita.

mi corazón salvage

Aquela.
Para além de tempos, gentes, cenários, sentidos.
E só conecta com tempos, gentes, cenários e sentidos porque vive, indelével, no que sou. Me reforça, me acende. E ascende. Destemida. Minha.

Só por essa já te teria Amor infinito, Belchis. ❤
Tu é foda.

Laura.

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Ouvindo bastante de ontem pra hoje o disco Vanusa Santos Flores, produzido por Zeca Baleiro, que fez a cantora Vanusa voltar a gravar depois de 20 anos, depois de uma fase funda de depressão. Que disco forte. Agora, mais ainda, tô entendendo a força das palavras de um artigo publicado no Estadão em outubro passado e que me tocou profundamente. É tudo que tá dito ali. Ofereço e indico às amigas e amigos a leitura e, em seguida, a audição do disco. É um mergulho nas forças e fragilidades de uma mulher que respira, agora, na superfície outra vez.

“Alguns discos são apenas discos, outros são vitórias.”

Laurita.

Link para o artigo:
http://cultura.estadao.com.br/noticias/musica,vanusa–depois-de-20-anos–lanca-disco-produzido-por-zeca-baleiro-,1777304

 

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Era inverno na alma. Fazia o percurso João Pessoa/Monte Horebe quando o 19 de março estava prestes a se anunciar pela madrugada longa, horas difíceis, caminho do litoral ao sertão para as despedidas do meu pai. O Divino o havia chamado, deu-lhe uma morte leve e nos agraciou com uma linda despedida. Mesmo assim, o céu derramava as águas que talvez eu precisasse chorar para merecer alívio. Também me recordara a tradição popular, e eu pensava na felicidade sertaneja com o bom inverno garantido pela chuva no dia de São José. Disse um amigo que, seguramente, ao chegar ao andar de cima, o Dr. Chico Dias convocou assembleia e, com a maestria na arte da fala que sempre o diferenciou, conseguiu convencer as divindades a abrir as comportas do céu e contemplar o sertão com abençoadas chuvas.

A corrente líquida dos céus ao chão avivava esperança de bom inverno. A corrente líquida que até hoje divide semblante, diz de almas encharcadas de saudade, aquela pelo Amor que fica, egoísta ainda pela falta da matéria. Mas o luto e a tristeza parecem ter propósitos, e a gente vai atravessando o sentimento em busca de equilíbrio para o espírito, na odisseia pelos mapas interiores. E por mais palavras que nos digam, nenhuma, nem todas, dão conta de aplacar a tristeza que vez ou outra nos arranca lágrimas, mesmo percebendo quão generosa foi a espiritualidade com o tão animado poeta, o boêmio, orgulho para sua terra, homem transparente e de caráter, que há pouco inventara mais um mote para suas poesias: “o martelo da morte é tão pesado, que a pedreira da vida não aguenta”. Frase de efeito, por quem escolheu levar a vida feito balanço de cadeira na calçada em fim de tarde: embalo vagaroso pra combinar com a tranquilidade da vida na serra do Horebe, sem ambição que lhe tirasse sossego, mas na retidão de caráter que lhe punha inteiro na vida e na labuta.

Dr. Dias, Chico de Joca, meu Painho, foi um sujeito do bem. Boa conversa, era dele que vinham os mais belos e motivadores discursos. E eu sei decoradas várias histórias, de poetas, de nossa família, da fantasia de seus amores platônicos, de juventudes, de aperreios, dos tempos de delegado, de advogado… Passei muitos anos com mania de ler dicionário, porque, quando menina, vivia no pé dele, que falava difícil com os amigos e eu, pra entender das coisas que ele dizia, decorava as palavras pra ver o significado no dicionário depois. Assim seguia no rastro dos sinônimos, descobrindo os sentidos da fala do meu pai. Foi ele que, além de medida de Amor e gentileza pra estar no mundo, me despertou a paixão pela palavra e pela poesia.

Ele sempre será meu grande amigo, minha inspiração, minha saudade feliz, minha saudade doída, minha gratidão, meu “eu te amo” todo telefonema, meus dedos das mãos iguaizinhos, a gentileza de nunca me deixar abrir a porta do carro, a caligrafia impecável, os comentários gentis nas fotos de internet, o pedido pra eu permanecer junto quando lhe faltavam forças. Tem também aquele lodo suave dos olhos, os olhos verdes, verdidos de esperança nos dias que sempre desejamos melhores..

Fomos e somos extensão um do outro, eu sei. E só tenho que agradecer o privilégio de tê-lo como pai nessa existência, por trazer no meu nome o nome de sua mãe, minha Vó Laurita. Agradecer o presente de estar ao seu lado até os últimos instantes nessa vida. Ele veio me velar e abraçar como sempre o fez, eternizando Amor.

Agora levo seus olhos nos meus, painho. Por hora, encharcados nesse inverno na alma. Obrigada por cada apoio, cada bilhetinho, cada carta, todo o orgulho, todo o Amor. Os elos desse Amor só se fortalecerão, e a saudade que fica é saudade boa, que só quem foi e fez feliz pode deixar. Que o Divino te proteja e te ilumine. Até o reencontro…

Sua filha,
Laurita.
Abril/2013

caminhante

caminhante


Tempo se assenta, ensinando a respirar melhor sem pressa, sem guerrilha pela sobrevida. Penso nesses dias melhores: coragem e ânimo pra chamar ao agora o que foi ficando pra depois – silêncios da Vida -, enquanto leio essa lindeza de Rosa:

.

“O senhor sabe o que silêncio é? É a gente mesmo, demais. Vivendo se aprende, mais, é só a fazer outras maiores perguntas. A gente sabe mais, de um homem, é o que ele esconde. A gente só sabe bem aquilo que não entende. Amor é a gente querendo achar o que é da gente.”

(João Guimarães Rosa. Grande Sertão: Veredas)

sinal das águas

invernada

Acordar com cheiro de chuva na terra molhada. Corri pra varanda. Antes das 5 e o dia claro. Despertei pensando estar no sertão em fim de invernada. De pé espiando o mundo e pensando em tanta estrada pra chegar até aqui… lembrança que também reforça o que sou, quem sou, as escolhas que me botaram na interessância do caminho, com gente tão especial junto, partindo da aguda escassez de possibilidades. A chuva fugaz foi simbora, mas me deixou aquele sinal das águas que vêm pra limpar e renovar. E como sertaneja, diante do mundo verdido e da natureza mais viva falando por passarim, tenho no meu coração muita gratidão pelos ciclos da Vida, pelos tempos áridos que forjam nossa resistência e resiliência, pelos sinais do Universo no tempo preciso. Daqui espio as flores. Muitas. É tempo delas. Essa lágrima é pra regar. Feliz.

tropicália lixo lógico

Compartilho com as pessoas que se interessam pela arte de Tom Zé dois registros incríveis do Programa Ensaio, da TV Cultura. O primeiro, de 25 anos atrás. Ambos foram determinantes para desatar os nós conceituais na minha dissertação do mestrado. Meu trabalho: “Desalinho à norma: um estudo de caso sobre marcas de oralidade em produções textuais na EJA“.

Olhar para a riqueza das tradições orais presentes no Recôncavo Baiano, na Irará de Tom Zé, na minha Monte Horebe e no alto sertão paraibano de onde vim. Isso foi essencial para que eu conseguisse estar no universo acadêmico questionando o cartesiano mas também compreendendo seus choques heurísticos com a cultura narrativa, trazendo labaredas de entendimento e percepções. Jamais me ocorrera antes ser parte do cartesiano acadêmico – ou ele de mim. Tanto pela minha identidade quanto pela identidade de minhas alunas e alunos da Educação de Jovens e Adultos, que têm uma forma outra de pensar e conceber conhecimento que não a aristotélica: “- Seu Antônio, quanto mede essa corda? – É meu tamanho mais duas braça”. Conhecimento genuíno desalinhado à norma, que não tem lugar nas estruturas escolares e continua se acomodando em margens sociais.

E pra falar só do povo do nosso terreiro paraibano que ouço sempre (sabendo que já já vou lembrar de um monte que não mencionei aqui), vejo essas heranças de nossa gente mais gente na literatura de Maria Valéria Rezende (que nasceu escritora na Paraíba), na música da Cabruêra, do Tocaia da Paraíba, de Escurinho, Chico César, Totonho, de Seu Pereira e Coletivo 401, Chico Correa&Eletronic Band, na Tribo Éthnos! E tantos e tantos. Faço questão de ter sempre essa arte em minhas aulas. E encanta. Um genuíno profundo vivíssimo presente também em Manoel de Barros e latente em Guimarães Rosa, ambos de minha cabeceira. A impressão que tenho é que vamos encontrando os fios condutores que botam muita gente na afinação e ousadia de peitar o estabelecido. E assim seguimos celebrando os Encontros.

Na estrada desses bons Encontros, Tom Zé pariu o “Tropicália Lixo Lógico” em 2012, amarrando os pensamentos sugeridos em registros até anteriores a esse vídeo do ano de 1990, que compartilho adiante. Veio mesmo bagunçar as lógicas estabelecidas, trazendo vivências, identidades e raízes preceptoras babás profundas, para contrapor consensos e traçar um desenho também profundo do Tropicalismo (sugiro ver o encarte do disco que explica tudo de um jeito bem didático!). Uma riqueza os suportes de sua expressão, da representação de seu pensamento e de suas experiências de conhecimento. Isso tudo é muito nosso. Sempre naquele limiar entre o que é música ou ruído, uma genialidade um pouco inalcançável para a liquidez desses tempos, que funde o extremo domínio da técnica com a onipresença de seu chão raiz e suas expressões de ser, pensar e dizer.

Na escola, o desafio é acolher a identidade da e do estudante, expressa em sua fala e refletida na escrita, sem deixá-la à margem do correto, mas como uma expressão outra do conhecimento, para além de padrões gramaticais. Assim o Tropicalismo fez quando diante do novo representado por guitarras elétricas. Conjugado junto das expressões e vivências sessentistas todas, esse novo foi gatilho disparador para trazer à tona a informação ancestral, seus preceptores babás e a referência da tradição oral analfabeta de Aristóteles, antes das crianças terem contato com o cartesiano escolar. Segundo Tom Zé, fenômenos daquele contexto como a semiótica, o processamento de dados, a teoria dos Quanta de Planck e o próprio mosaico da TV levaram o Brasil da Idade Média para uma segunda Revolução Industrial. A equação disso tudo é deleite para os sentidos: ouvidos, retinas, aroma, arrepio, apetite! Na escola, é olhar para as e os estudantes fora da sombra do fracasso escolar, mas podendo conjugar, também juntos, seus saberes narrativos e o novo cartesiano, quando decifrar a escrita pode ter o mesmo assombro doloroso e maravilhado que o Tom Zé dos anos 90 descreve no vídeo compartilhado adiante. De modo que nós educadoras e educadores populares enxergamos riqueza e genialidade em nossas salas de aula, onde é mais lógico perceber ruído.

Bem, é assunto demais. Sugiro os vídeos completos. E pra verouvir a profundeza da fala de Tom Zé sobre as culturas orais e o jeito de aprender (Freireano!) passe aí pros 28min50seg no primeiro vídeo, de 1990.

No segundo vídeo mais um registro precioso e imperdível pra decifrar os caminhos interiores de sua arte. Taí ele próprio explicando com muita profundidade o disco e, consequentemente, a Tropicália.

Programa Ensaio | Tom Zé | 1990

Programa Ensaio | Tom Zé | 10/08/2013

Tom Zé

tom zé

Hoje é aniversário desse baiano de Irará que me inspira pra Vida! 79 anos. Vanguarda nos 60′ e vanguarda hoje. O Não-padrão. Conexão com a gente brasilis e sua unimultiplicidade. Desalinho. Assimetria. Antropofagia de faminto. Mas Tom Zé já era Tom Zé antes da Tropicália… e continua sendo. Quem mais? Faz tempo que o estudo, ouço, degusto e sempre fico mais de cara com o nó de cada ponto que ele dá. Que maravilha é estar nesse tempo e no mesmo mundo que ele, seguir nas pistas da razão de ser de sua arte. A imensidão desse Zé jamais caberá em palavras, guiçá em sentidos. Vida longa ao mestre!

a serra do Horebe

Dia 5 de dezembro foi aniversário de minha amada Monte Horebe. Bem novinha, 52 é o número que conta seus anos. Quem me conhece um pouquinho de nada, já sabe o quanto a coloco nos meus mapas, onde quer que eu esteja.

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A serra do Horebe é o abraço de Soizinha.
É seus olhos não enxergarem e ela me reconhecer por esse abraço.
É a carne de sol com fritas e cerveja geladíssima lá de Almir.
É manga “diveiz” com sal e aquele pão paulista de Bedeta.
É estar em João Pessoa e fazer linha reta de frente pra trás, leste a oeste, no mapa da Paraíba, pra mostrar onde fica a terrinha.
É a “crechinha” que eu amo: um monte de criança linda que me chama de Tia Laurita e adora desabar comigo pro sítio, carro entupido de “mininu” perguntando cadê aquela música de Chico César que eu sempre ouço. (rs)
É o balanço da cadeira, fim de tarde, enquanto o sol se deita ao som de boa prosa, gente botando assunto em dia pelas calçadas.
É ter notícias de que ex-alunos da serra do Braga, de 13 anos atrás, foram na casa de mainha, dia de feira, me deixaram um abraço e mandaram lembrança.
Horebe é minha raiz Dias do Nascimento: Vô Venâncio num busto no meio da praça e as lembranças mais recentes de painho, Rodrigo, Orlando, Vô Joca e Vó Daíva, arrudiando meu juízo com um monte de saudade.
É a ida à casa dos tios pra dar a “bença” e aqueeeeleee cheiro nos primos.
É o convite recorrente a todos os meus amigos pra sentir o friozinho da serra, a vontade de levar os hermanos da Arte pra fazer um festival com um monte de oficinas por lá.
Monte Horebe é a escassez de possibilidades que, mais grave tempos atrás, me empurrou tão cedo pra beber do mundo e aguçar intuição.
Mas Monte Horebe também é apostar na juventude que se desalinha ao óbvio, ao banal e ao medíocre.
É a força de minha mãe Lindeci e a sensibilidade de meu pai Chico Dias.
A amorosidade, confiança e proteção que hoje sinto do meu irmão Franklin.
É a lembrança de meu irmão Rodrigo brincando com minha sobrinha Letícia e com Malu, sua cadela quase gente que foi morar com mainha quando ele foi morar no cosmo.

É rir sozinha lembrando das histórias engraçadas de quando painho era delegado.
É correr na casa de Valdir, difíceis tempos, pra mostrar poesia nova a ele, e viu-se verso(!), e assim manter a sanidade!
É ensaiar coreografia com Ivacarla, meninas-moças ainda, pra dançar igualzinho na próxima festa na quadra. Kkkk
É pensar em Luksfran com a certeza de que a distância separa matéria, nunca a energia das amizades verdadeiras.
É ser uma das 5 Lauritas da Família, em memória de minha vó que morreu durante um parto e inspirou verso bonito de meu pai: “na parede que mamãe botou cortina, uma aranha teceu e fez morada”.
O Horebe é o Sítio Pinga, onde aprendi a andar de bicicleta, dirigir e vivenciar a afetividade de ser professora/educadora aos 15 anos de idade.
O Pinga de painho de minha infância, onde chupei muita laranja, tomei muita água de coco e de onde ainda lembro o gosto dos cajus daquele pé perto da cerca, divisa com a terra de seu Onofre e seu curral.
O Pinga, onde hoje mainha recebe a mim e meus amigos com tanto Amor, cuidado e respeito ao diferente.
Horebe é meu desejo de vida mais simples, num futuro já já, fugindo do caos e cuidando de minha hortinha orgânica no terreiro de casa.
É o céu mais estrelado do mundo e o luar esplendoroso, que ocupa tanto dessas minhas memórias afetivas.
Diz meu amigo Irapuan que na serra do Horebe a gente fica mais perto de Deus.

O luar é feito esse, dessa foto linda de Wênio Pinheiro Araújo, na nossa ida pra lá na Semana Santa de 2012.

Nomes Combinados

Presente imaterial de aniversário. Por 1N1. Foto e texto.

Teus nomes combinados

Teus nomes combinados
Em um osso
Partido, um Coração
Selvagem,
Selvagem Vento
A sacudir uma Flor
De Maracujá
Ao oeste
Onde a memória
É salgada
Feito suor
Ou lágrima
Que escorre
Pelo rosto
E Pinga, Pinga, Pinga…
Do queixo agudo
Como o olhar.

W.P.A.

Paccelli era casa

Os deuses das feras têm sido lenientes, inda mais quando é quase insana a 
falta que sinto de Gurgel. Sempre (re)descubro um texto, um som, um livro, 
um poema ou um email que me vem na hora precisa e me bota pra frente, quando
o cansaço pesa sobre os ombros e a presença/palavra dele seria(é) essencial.
Paccelli pra mim era casa...




"Laura, tá difícil? Tudo bem. Você é de ferro
 e aço só se tempera na porrada mesmo..."
 


Era uma seleção pra professor substituto do então CEFET, que eu não tinha
sido aprovada. Escrevi duas frases pra ele, que de resposta me mandou um
esculacho, pero sin perder la ternura jamás... na verdade ele viu que o
bicho tava pegando e mandou no tom necessário pra eu conseguir me manter ao
leme... ele era maestro nisso.
Acabo de ler e, depois de pedir a devida licença ao Senhor das Tormentas,
posto sua resposta nos mapas d'O Meu Acaso do Som, pra acender o coração nesse
tempo que tudo pede pressa e deixa a gente longe da gente...

¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

>""""Não fui classificada.
>E lá se foi embora mais uma tentativa...""""""
>
>E daí?????
>Vc sabe muitíssimo bem que aquilo era transitório, um porto mais ou menos 
>seguro onde pudesse lamber as feridas antes de retornar a rinha.
>Sua carreira está desenhada. O desfecho ja se afigura no horizonte , coisa 
>que tempos atras vc não tinha (horizonte). Mais uns anos (2, 3, no máximo 
>4) e vc sentará esse belo rabo num banco da academia dando um pouco de luz 
>àquele ambiente sombrio, chato, reacionário e pseudo-pensante. Quem sou eu 
>pra te falar de estratégias, vc uma sobrevivente de berço... Mas pra não 
>passar batido (e caindo na esparrela do lugar comum, minha mania 
>ultimamente) leve as coisas em doses homeopáticas. Em que pese os apelos do 
>estômago, vái colecionando os dias da melhor forma possivel. VIVA... POR 
>FAVOR, VIVA... É um momento belo esse.... O seu movimento é sempre 
>ascedente. Seu paladar torna-se mais apurado, os sabores desmembrados em 
>partes , o retrogosto duradouro que so o degustador mais refinado é capaz 
>de suster. TUDO ISSO AINDA COM VINTE E POUCOS NAS COSTAS. Esquece aquela 
>merda de "oportunidade". Vai se segurnado nos pinceis do jeito que der. Use 
>a tática dos grandes felinos. Eles se lançam contra um rebanho sem se 
>deixar enganar pelo numero, pelos apelos dispersivos da manada... Fixam uma 
>vítima e so descansam quando a transformam num bife ou o fôlego falta. FIXE 
>UMA VITIMA. Não se deixe dispersar por um ou outro apelo de bosta, em que 
>pese o estomago. De novo, menina: VIVA.
>Um dia me foi dito que de certa forma contibui pra vc ser o que é. Não acho 
>que tal contribuição tenha alguma valia se observado o todo. Se de alguma 
>forma cheguei e lhe passar um valor, uma informação, uma postura e essa 
>doação vingou , ERA PORQUE A MATERIA PRIMA ERA PROPICIA. Merito seu então. 
>Mas se mesmo assim vc achar nos alfarrabios do espirito algo meu, saiba que 
>EXIJO DE VC QUE VIVA E CHEGUE LÁ. Não sou original.. Afinal quem o é? 
>Platão botou pra foder quando berrou que "nascemos originais e morremos 
>cópias". Portanto o que quer que tenha deixado pra vc , TENS A OBRIGAÇÃO DE 
>PASSAR PRA FRENTE. Portanto menina, VIVA E CHEGUE LÁ...E PERPETUE VC...
> A noite dos cristais, dos vestidos longos negros e sobretudos, os 
>vinhos e velas... o jantar pra celebrar os degraus alcançados, em suma,
>se configura cada vez mais impossivel. 
>Não por vc , mas por mim mesmo. Talvez o tempo tenha se esgotado de uma vez 
>por todas. O que sabemos nós... Sabemos sim, com certeza, que as 
>oportunidades ainda não foram perdidas... As suas opotunidades... Aquelas 
>com algum futuro.
>Que os Deuses e Deusas Olhem Por Tí
>